Identidade e gestão universitárias: um estudo em universidades federais brasileiras

Amaral, Isabela Grossi; Brigato, Angelo
Abstract:
As universidades vêm sendo criticadas e profundamente modificadas ao longo das últimas décadas, embora já tenham passado por situações semelhantes ao longo de toda a sua história. Em seus períodos iniciais (por volta do século XII), as universidades aceitavam todos os que desejassem se tornar membrum universitatis, em nada influenciando sua origem, status, distância, riqueza ou pobreza, nem mesmo deficiências físicas, incluindo a cegueira. Mesmo com toda a obsessão em torno dos estatutos, a pessoa poderia ingressar desde que possuísse os recursos necessários. Assim, eram duas, basicamente, as razões para tal facilidade de acesso: a característica fundamental da universidade, e o sistema geral de educação que existia na Idade Média (SCHWINGES, 1996). A universidade foi concebida, inicialmente, como uma associação de indivíduos, corporações comunais, características da vida coletiva das associações, irmandades, colégios e famílias. A história subsequente da universidade é “a história da progressiva institucionalização, racionalização e, finalmente, ‘despersonalização’ dos universitas studii” (SCHWINGES, 1996, p. 172), que continuou até os tempos modernos, a despeito das crises e transformações por que passaram as universidades em toda a Europa. As universidades eram constituídas por comunidades de indivíduos, a associação de estudantes em torno do professor era a regra geral, independentemente de se basear no modelo de Paris ou de Bolonha. Não havia um edifício principal, algo que só vai acontecer a partir de meados do século XVI, cujo “aparecimento constitui um enorme passo em frente no sentido do conceito da universidade como instituição, em oposição ao conceito da universidade como uma associação de indivíduos em torno de um professor” (SCHWINGES, 1996, p. 173). O elo entre o estudante e o magister era, portanto, o único critério segundo o qual alguém era admitido na universidade, e que continuou como o padrão generalizado até fins da Idade Média, quando os estatutos tornaram-se mais rigorosos (SCHWINGES, 1996). Segundo Trindade (1999), o corporativismo, a autonomia e a liberdade acadêmica são a base da universidade medieval. A universidade, para chegar à configuração como conhecemos, passou por transformações desde sua criação na Idade Média, influenciada por movimentos emblemáticos e globalmente significativos, como o Renascimento, a Reforma e a Contra-Reforma, o Iluminismo, além da influência dos intelectuais e das Academias. Daí a ideia de que a universidade parece estar sempre em crise. Conforme Torgal (2010), a crise é própria de uma sociedade em movimento, assim como é própria do ser humano; representa, normalmente, um estado de passagem. Mas, obviamente, a crise da instituição universitária não se dá de forma isolada nem descontextualizada. Ao contrário, ela está no bojo e constitui um espaço muito maior em que diversas crises coexistem, sejam elas do modelo econômico, do modelo de sociedade e assim por diante. Assim, passamos por “momento de mudança histórica [em que] as estruturas culturais de sustentação educacional, forças econômicas e ideologias políticas estão mudando muito rapidamente e construindo algo novo” (COWEN 2000, p.135). Em outras palavras, não se trata de um problema exclusivo da universidade, mas de uma questão muito mais complexa que envolve os sistemas educacionais. Neste sentido, diversos especialistas têm percebido e realizado críticas à universidade relacionadas à crises mais amplas e profundas. Por exemplo, Calhoun (2006) discute a questão do bem público versus privado, mostrando como tal debate afeta a universidade. Magalhães (2006), por sua vez, entende que a crise da instituição universitária como concomitante à crise da modernidade. No Brasil, as críticas têm assumido um tom semelhante ao de investigadores estrangeiros, como Ribeiro (1969), Trindade (1999), Chauí (1999), Rodrigues (2001), Leher (2004), Nussenzweig (2004), Sguissardi (2005, 2006), dentre outros. Assim, chega-se ao século XXI cuja caracterização geral mais ampla é aquela que o define como sendo relativo à chamada sociedade e economia do conhecimento, o que exige dos Estados um novo posicionamento acerca de sua inserção num mundo globalizado e em rede. Para tanto, é defendida a ideia de que os países devem adotar estratégias nacionais de desenvolvimento baseadas no conhecimento, cujo domínio propiciaria tanto o desenvolvimento interno quanto a competitividade na economia global. Neste contexto, cuja lógica defendida pelos países centrais implica a livre concorrência e baixo envolvimento (e investimento) governamental, as empresas assumem papel de ator privilegiado. Também neste contexto, ganha força o campo da ciência e tecnologia (C&T) – para o qual o conhecimento constitui fonte de produção, de competição e de riqueza nacional – a qual assume contornos da principal estratégia de desenvolvimento dos países. Assim, conhecimento e educação passam a ser compreendidos como insumos e produtos num mercado global, enquanto ao Estado competiria cuidar de aspectos assistenciais. Em outras palavras, atribui-se às universidades um papel central de agente do desenvolvimento econômico, cuja função é gerar capital humano para o desenvolvimento de tecnologia Tomando como pressuposto que as universidades têm adotado um ordenamento institucional de gestão baseado nas premissas fundamentais da chamada genericamente “nova gestão pública”, implementada no país desde o início da década de 1990 no âmbito da reforma do Estado, o artigo discute a concepção de universidade e de sua gestão a partir do estudo de quatro casos empíricos, realizado em universidades federais brasileiras. Foram ouvidos todos os três segmentos da comunidade acadêmica, por meio dos seus representantes nos respectivos conselhos superiores das universidades. Os resultados apontam convergências e unanimidades, mas também trazem ambiguidades, tensões e contradições quanto à identidade e atuação da universidade, o que suscita questões que ainda estão longe de serem respondidas.
Área(s) temática(s):
Año:
2016
Tipo de publicación:
Paper/Extenso Congresos GIGAPP
Número:
2016-181
Serie:
VII Congreso Internacional en Gobierno, Administración y Politicas Públicas. GIGAPP 03-05 octubre 2016.
Dirección:
Madrid, España
Organización:
GIGAPP. Asociación Grupo de Investigacion en Gobierno, Administración y Políticas Públicas
Mes:
Octubre
Comentarios:
Pesquisa realizada com o apoio da FAPEMIG, cuja entidade os autores agradecem.
Hits: 12643